Churrasco de Verão
Passa da meia-noite. As filhas de Bento foram dormir. Sua mulher, Daniela, conversa na sala com a namorada de Clóvis, Roberta. Depois de meia dúzia de cervejas começa a bater a canseira em Clóvis. Bento, prevendo que o amigo já está se entregando, esmaga um limão no fundo e um copo grande para preparar uma caipira que irá despertar os dois. Clóvis, despreocupadamente, lasqueia a carne fria do churrasco com uma faca e vai mastigando lentamente. Paralisa o olhar atrás da cabeça de Bento. Um pôster desses de camelô, plastificado, colado com fita isolante na parede,logo acima da churrasqueira. Nele, Fernandão ergue a taça de campeão mundial de 2006 em meio a chuva de confetes das entregas de taças da FIFA e sorridentes jogadores colorados, entre eles, Gabiru, na volta do capitão do Internacional.
Clóvis é gremista. Ele e Bento são amigos desde o antigo primeiro grau. Bento nota que ele observa o pôster, mas não fala nada. Os dois sabem da vontade com que torcem para os seus times. E sempre se respeitaram dentro do limite das gozações entre amigos. Daqueles que tiram sarro um do outro, mas não se estressam. Nem sempre foi assim. Bento se recorda de quando encontrou Clóvis numa das primeiras aulas e brigaram na saída do colégio. Clóvis tinha cuspido na camiseta do Figueroa de Bento. Depois, Bento amargurou seu primeiro revés no Gauchão que não terminou, em 1977, o nono campeonato consecutivo.
Bento ainda conta, só pra ele mesmo, o Gauchão de 78 como o décimo na seqüência. Depois, o tri invicto em 79, o tetra gaúcho do começo da década de 1980. E a pegação de Clóvis com a derrota para o Nacional na Libertadores de 80, o desdenhado campeonato brasileiro de 81 deles, a maldita foto do De Leon ensangüentado. A idade média colorada somente começava.
Enquanto Bento misturava o açúcar com o limão e a cachaça no copo, Clóvis tentava revirar os olhos e não ser pego pela tentação do pôster da parede. Mas não conhecia. Bento continuava devaneando, agora sem observar Clóvis. As desilusões coloradas. A derrota para o Olímpia, os vices consecutivos, a felicidade com uma insossa Copa do Brasil perdida no meio do caminho. Quarta estrela sem brilho. Sofrimento e dor até o glorioso ano de 2006. Clóvis tinha se separado da primeira mulher. Seu filho de cinco anos que só poderia ver a cada duas semanas. Os churrascos dos dois amigos foram cada vez mais rareando. As gozações entre ambos se perdendo no tempo. Clóvis tomando o primeiro gole da caipira ainda em silêncio, paralisado no pôster. Maldito pôster. Bento agora voltava a notar a inquietude do amigo.
Tencionou falar sobre a pré-temporada da dupla Gre-Nal, mas não achou legal interromper Clóvis. A melhor gozação se dá na espera do outro. Cada vez mais nervoso. Clóvis aguardando a primeira fala de Bento. Quase implorando que este tirasse uma onda. Piada pronta. Grêmio ganha de Flamengo e São Paulo antes do Gauchão. Mas nada de Bento falar.
Até que Roberta e Daniela voltam para a cozinha comentando sobre uma reportagem que assistiam num desses programas de fofoca. Viu só como parece mesmo? A guria tá imitando a Victoria Beckham. Que guria? Interrompe Bento. A Deborah Secco, responde Daniela. Ah, a Débora Secco, reverbera Clóvis. Bento olha para trás. Para o pôster. Clóvis faz de conta que não vê. Depois não se agüenta. Porra, Bento, não vai falar nada? Bento sorri, beija Daniela e pergunta se as meninas estão dormindo bem. Ela responde que sim. Vai até a geladeira e abre uma cerveja. Nada melhor que uma Brahma Extra bem gelada depois da caipirinha. Roberta comenta. Eu vi no noticiário da TV que o Grêmio contratou um tal de Roger. É o mesmo que namora a Deborah Secco? Bento e Clóvis se entreolham. Bento serve o copo do amigo. Clóvis vira o copo num gole só. Porra, Bento! Não me sacaneia, tchê! Bento não responde.
Estaciona do lado da churrasqueira, aponta pro pôster com a cabeça. É bonito esse Gabiru, não acham? As mulheres riem. Clóvis enche o copo de cerveja de novo e resmunga. Filho da p...! Tu é um filho da p..., Bento! E mata mais um copo num gole.
Fonte: FINAL SPORTS
Clóvis é gremista. Ele e Bento são amigos desde o antigo primeiro grau. Bento nota que ele observa o pôster, mas não fala nada. Os dois sabem da vontade com que torcem para os seus times. E sempre se respeitaram dentro do limite das gozações entre amigos. Daqueles que tiram sarro um do outro, mas não se estressam. Nem sempre foi assim. Bento se recorda de quando encontrou Clóvis numa das primeiras aulas e brigaram na saída do colégio. Clóvis tinha cuspido na camiseta do Figueroa de Bento. Depois, Bento amargurou seu primeiro revés no Gauchão que não terminou, em 1977, o nono campeonato consecutivo.
Bento ainda conta, só pra ele mesmo, o Gauchão de 78 como o décimo na seqüência. Depois, o tri invicto em 79, o tetra gaúcho do começo da década de 1980. E a pegação de Clóvis com a derrota para o Nacional na Libertadores de 80, o desdenhado campeonato brasileiro de 81 deles, a maldita foto do De Leon ensangüentado. A idade média colorada somente começava.
Enquanto Bento misturava o açúcar com o limão e a cachaça no copo, Clóvis tentava revirar os olhos e não ser pego pela tentação do pôster da parede. Mas não conhecia. Bento continuava devaneando, agora sem observar Clóvis. As desilusões coloradas. A derrota para o Olímpia, os vices consecutivos, a felicidade com uma insossa Copa do Brasil perdida no meio do caminho. Quarta estrela sem brilho. Sofrimento e dor até o glorioso ano de 2006. Clóvis tinha se separado da primeira mulher. Seu filho de cinco anos que só poderia ver a cada duas semanas. Os churrascos dos dois amigos foram cada vez mais rareando. As gozações entre ambos se perdendo no tempo. Clóvis tomando o primeiro gole da caipira ainda em silêncio, paralisado no pôster. Maldito pôster. Bento agora voltava a notar a inquietude do amigo.
Tencionou falar sobre a pré-temporada da dupla Gre-Nal, mas não achou legal interromper Clóvis. A melhor gozação se dá na espera do outro. Cada vez mais nervoso. Clóvis aguardando a primeira fala de Bento. Quase implorando que este tirasse uma onda. Piada pronta. Grêmio ganha de Flamengo e São Paulo antes do Gauchão. Mas nada de Bento falar.
Até que Roberta e Daniela voltam para a cozinha comentando sobre uma reportagem que assistiam num desses programas de fofoca. Viu só como parece mesmo? A guria tá imitando a Victoria Beckham. Que guria? Interrompe Bento. A Deborah Secco, responde Daniela. Ah, a Débora Secco, reverbera Clóvis. Bento olha para trás. Para o pôster. Clóvis faz de conta que não vê. Depois não se agüenta. Porra, Bento, não vai falar nada? Bento sorri, beija Daniela e pergunta se as meninas estão dormindo bem. Ela responde que sim. Vai até a geladeira e abre uma cerveja. Nada melhor que uma Brahma Extra bem gelada depois da caipirinha. Roberta comenta. Eu vi no noticiário da TV que o Grêmio contratou um tal de Roger. É o mesmo que namora a Deborah Secco? Bento e Clóvis se entreolham. Bento serve o copo do amigo. Clóvis vira o copo num gole só. Porra, Bento! Não me sacaneia, tchê! Bento não responde.
Estaciona do lado da churrasqueira, aponta pro pôster com a cabeça. É bonito esse Gabiru, não acham? As mulheres riem. Clóvis enche o copo de cerveja de novo e resmunga. Filho da p...! Tu é um filho da p..., Bento! E mata mais um copo num gole.
Fonte: FINAL SPORTS
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